De acordo com Apolinário (2016), há significativa distinção entre “modos de produção” e “modelos produtivos”. Para o autor, enquanto os “modos de produção” correspondem às formas de organização político-econômico-sociais tais como o escravismo, o feudalismo e o capitalismo, os quais vinculam-se aos contextos evolutivos consonantes aos processos de apropriação dos instrumentos de trabalho, direitos de propriedade, repartição do excedente social e regramentos acerca da escala de reprodução social do trabalho; os “modelos produtivos” são formas de acumulação intrínsecas ao capitalismo, tais como a produção cooperativa, a manufatura, a maquinofatura, o taylorismo, o fordismo, o toyotismo e o volvismo, os quais permitem ao capital administrar os antagonismos das classes sociais, os conflitos produtivos e organizacionais, e as crises da economia bem como seus desdobramentos, sem, no entanto, promover fraturas nas bases que alicerçam o capitalismo.
Os estágios de produção capitalista, correspondem às etapas de evolução dos modelos de produção definidos tanto pelas forças produtivas, quanto pelas relações sociais estabelecidas nas esferas de produção. Ao longo do tempo, a produção, modelada conforme os conflitos e contextos econômicos de cada época, tem fundamentado o desenvolvimento do próprio capitalismo como sistema econômico dominante, bem como seus ordenamentos, desde o seu surgimento na Europa Ocidental do século XIII, verificado a partir dos movimentos de desestruturação do sistema feudal e de suas relações de produção-trabalho, da apropriação privada dos meios de produção e da mercadorização da força produtiva humana, até os dias atuais.
Hunt (1981) entende as forças produtivas definidoras do sistema capitalista como a tecnologia produtiva socialmente disponível constituída pelas somas do estado atual do conhecimento técnico-especializado-organizacional dos trabalhadores, com as ferramentas, máquinas, equipamentos, implementos e matérias-primas, necessários para a composição dos bens finais orientados para o mercado. Contudo, desde a sua concepção, o capitalismo é conduzido à uma espécie de autofagia que assegura sua longevidade através da extinção dos processos que deixam de garantir – em níveis satisfatórios –, o excedente social (produção material deduzida dos custos produtivos) necessário para a sua existência; ou através da reinvenção dos processos produtivos de maneira a perpetuarem exponencialmente a formação dos excedentes sociais a serem apropriados pelo capitalista. E essa divisão entre classe social que produz (trabalhadores) e classe social que se apropria (capitalista) descreve as relações sociais da produção no sistema capitalista.
No capitalismo, as interrelações produtivas-comerciais-acumulativas são impessoais. A produção de mercadorias ocorre tanto para suprir a necessidades econômico-financeiras do trabalhador a partir da mercadorização de sua força de trabalho, quanto para satisfazer o valor de uso que os consumidores lhe atribuem, bem como para gerar riquezas a serem apropriadas pelo capitalista a partir do valor de troca pelo qual tais mercadorias são negociadas no mercado. E a necessidade de sustentar esse ciclo, especialmente em cenários de desarmonização econômica, faz com que os modelos produtivos evoluam.
Desse modo, frente ao caráter cíclico das economias, tem-se que é cerne da evolução do sistema produtivo capitalista em sua trajetória de aperfeiçoamento das formas de produzir, que os processos de trabalho estejam sujeitos a transformações consonantes com os movimentos de valorização do capital alicerçados no trabalho vivo, o qual, simultaneamente perde valor pela incorporação de inovações técnicas e tecnológicas que conduzem à ampliação de sua produtividade. E para Teixeira (2007), a viabilidade de tais movimentos, ocorre somente enquanto forem positivas as diferenças de investimento entre capital variável (força de trabalho humana) e capital constante (meios não-humanos de produção – máquinas, equipamentos, insumos, etc.), reascendendo o impulso produtivo capitalista de capturar excedentes do trabalho, ao aumentar a aplicação do trabalho morto às custas do trabalho vivo.
Nesse sentido, o presente trabalho busca descrever como as maneiras de produzir encenaram estágios de evolução consonantes com a consolidação e desenvolvimento do próprio capitalismo como sistema econômico, desde as sua primeira forma produtiva no estágio da produção cooperativa – quando já se verifica os rudimentos da ruptura entre a concepção intelectual do produto, os meios de produção, e as habilidades da força de trabalho; passando para a produção manufatureira – prelúdio da divisão clássica do trabalho; a era das máquinas na maquinofatura – quando a intensificação das jornadas de trabalho incorpora caráter desumanizador do ritmo de produção; o modelo científico de Taylor – quando a correção técnica e temporal das operacionalizações nos processos fabris introduz formas eficientes e padronizadas de produção; a revolução produtiva de Ford – quando se verifica a ultra especialização do trabalho e a maximização do ritmo de produção introduzidos pelas esteiras mecânicas nas linhas de produção à serviço da produção em massa; até a recondução da produção a ritmos diferenciados a partir da reconfiguração dos mercados consumidores e da mão-de-obra multifuncional com os modelos pós-industriais de acumulação flexível toyotismo e volvismo.
(A autora)